Pesquisadora destacada em 2016, Celina Turchi conta sua trajetória
Em um mundo onde as mulheres representam apenas 28% do total dos pesquisadores (segundo a ONU), a Dra. Celina Turchi se destaca. Em dezembro de 2016, a revista Nature incluiu a médica na lista dos dez cientistas mais importantes do ano. Celina coordenou uma força-tarefa, com cientistas brasileiros e de outros países, e o grupo foi responsável pela descoberta da associação entre o vírus da zika e a microcefalia – ação essencial para nortear o trabalho de prevenção e acompanhamento de grávidas residentes em áreas de risco em todo o planeta.
“Recebi a citação com surpresa e prazer. Entendo que o reconhecimento foi para o grupo de pesquisadores (MERG) que se dedicou a elaborar projetos de pesquisa, respostas as perguntas, durante a emergência em saúde pública (microcefalia epidêmica)”, conta a pesquisadora.
Para seguir a sua trajetória profissional, entre os desafios que enfrentou, Celina conta que um dos primeiros foi concluir o curso de Medicina já casada e com dois filhos pequenos. “Nessa caminhada, contei com a solidariedade das mulheres: minha sogra a quem sou e sempre serei grata e das minhas irmãs pelo apoio irrestrito.”
A pesquisadora afirma que seu sonho é “estar sempre pronta e lúcida para viver intensamente o que a vida me oferecer daqui para frente”. Como inspiração para homens e mulheres, o Movimento Mulher 360 entrevistou a pesquisadora para saber de que forma ela encara os desafios no campo profissional, qual a importância do destaque feito pela Nature e como equilibrar vida pessoal e profissional em meio a todos os acontecimentos.
Entrevista com Celina Turchi
Movimento Mulher 360: Quando surgiu a vontade de se formar em medicina e ser pesquisadora?
Celina: Foi bastante cedo, acredito que durante a adolescência. Sou de uma família de professores onde estudar representa um valor fundamental e foi sempre muito reforçado. Já seguir a carreira de pesquisadora foi durante a Faculdade de Medicina, com a inserção em projetos de pesquisa. Quero mencionar que minha mãe foi professora de Letras na Faculdade de Goiás, e uma das primeiras PhD da região Centro-Oeste ainda na década de 50. Todas as minhas irmãs são PhD em diferentes áreas de conhecimento, uma família de amante de livros.
Movimento Mulher 360: Você percebe a discriminação ou as dificuldades específicas em relação às mulheres na área de pesquisas científicas? Como isto pode ser observado? Como superar?
Celina: Felizmente nunca me senti discriminada, pois participei e participo das redes de pesquisa onde o ambiente de trabalho é sempre respeitoso. Porém, estamos trabalhando na sala de reuniões do CPqAM-FIOCRUZ- PE onde há um mural com fotos de todos os diretores dessa instituição de pesquisa. Há somente uma foto de mulher (Dra. Eridan de Medeiros Coutinho) entre os ex-diretores dessa instituição. Parece um bom exemplo sobre a necessidade de ampliar o número de mulheres nessas funções. Muito interessante é que, entre os cientistas nominados pela Revista Nature, há três mulheres. Por exemplo, a física Elena Long chamou a atenção para a discriminação e os obstáculos enfrentados por cientistas lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros como físicas nucleares.
Movimento Mulher 360: De que forma o destaque feito pela Nature pode incentivar a inclusão e o interesse das mulheres na sua área de trabalho?
Celina: Ver outras mulheres que ocuparam posições de destaque pode ser um estímulo para todas.
Movimento Mulher 360: Quando olha para o seu o trabalho hoje, quais são os maiores destaques da sua trajetória?
Celina: Participar de várias redes de pesquisa, com excelentes pesquisadores do Brasil e do exterior foi um privilégio na minha trajetória acadêmica. Cito a participação no IATS (Instituto de Avaliação de Tecnologia em Saúde) e em estudos multicêntricos da hepatite B coordenado pela Universidade de Pernambuco.
Movimento Mulher 360: De que forma você lida com as atividades da vida pessoal e profissional? Consegue equilibrar bem as duas partes?
Celina: Posso citar Adélia Prado: “Mulher é desdobrável…” Penso que todas as mães que trabalham (tenho dois filhos, com 41 e 20 anos) carregam uma certa culpa, um certo sentimento que poderiam ter participado mais da vida dos filhos. No entanto, somos mulheres do nosso tempo e cada geração carrega as facilidades e dificuldades do período histórico que vive. Considero que tive oportunidades excepcionais e a minha família extensiva e nuclear sempre me apoiaram irrestritamente.
Movimento Mulher 360: Qual recado deixaria para mulheres que gostariam, mas têm receio de ingressar na carreira de Ciências devido ao seu gênero?
Celina: A carreira de pesquisadora/professora apresenta sim muitos desafios, mas também enormes possibilidades para o crescimento tanto pessoal quanto profissional. Mulheres sejam bem-vindas e aproveitem bem as oportunidades sem ideias pré-concebidas.