Consultoria afirma que filhos são um programa intensivo de desenvolvimento de soft skills
Conciliar a carreira e a criação dos filhos ainda é um grande desafio para os profissionais, principalmente para as mulheres. Isso porque o mercado de trabalho ainda vê a questão com preconceito e , muitas vezes, considera que após o nascimento dos filhos o colaborador não terá o mesmo comprometimento.
Esse cenário é comprovado por meio da pesquisa feita pela MindMiners em 2017, em que 47% das entrevistadas se sentiram rejeitadas em um processo seletivo por serem mães ou desejarem ser. Outras 46% foram vistas com maus olhos no trabalho quando precisaram cuidar de alguma situação ligada ao filho.
O retorno da licença-maternidade também é um momento crítico. Um estudo da Fundação Getúlio Vargas aponta que 48% das mães não retornam ao trabalho em até dois anos após o nascimento das crianças.
Com o objetivo de transformar essa realidade e demonstrar às empresas os benefícios da valorização por profissionais que são mães ou pais , a consultoria Filhos no Currículo desenvolve programas corporativos para criar um ambiente acolhedor e que promova a cultura da diversidade.
“Defendemos a humanização do mercado de trabalho, incentivando que as pessoas não tenham receio de contar quem são e colocar o filho no currículo como um valor. Acreditamos que o exercício da parentalidade desenvolve diversas novas habilidades desses profissionais como empatia, criatividade, resiliência e liderança – competências exigidas pelo mercado, mas nem sempre reconhecidas nos profissionais com filhos”, afirmam Camila Antunes e Michelle Levy Terni.
Em entrevista ao Movimento Mulher 360, as executivas falam sobre os desafios de fazer com que o mercado entenda que há benefícios para empregadores que contratam esses profissionais. Elas dão dicas de como as empresas podem avançar nesse tema e fazer com que seus colaboradores se sintam mais seguros. Confira.
MM360 – Recrutadores devem abordar a questão “filhos” na hora de entrevistar um candidato? Qual seria a melhor forma de fazer isso?
A pergunta “ter filhos” não deveria ser um problema durante uma entrevista de emprego num mercado de trabalho maduro. Sabemos que a realidade não é bem assim e trabalhamos para desconstruir o viés negativo de que filhos atrapalham a carreira de pais e mães. No contexto atual, não recomendamos que a pergunta seja feita, uma vez que as pessoas devem ser contratadas pelas suas competências. Defendemos a humanização do mercado de trabalho, incentivando que as pessoas não tenham receio de contar quem são e colocar o filho no currículo como um valor. Acreditamos que o exercício da parentalidade desenvolve diversas novas habilidades nesses profissionais, tais como empatia, criatividade, resiliência, liderança. Competências essas exigidas pelo mercado de trabalho, mas nem sempre reconhecidas nos profissionais com filhos. Munidas dessa intenção, lançamos junto com a aceleradora B2mamy o pontapé inicial do movimento #meufilhonocurriculo pela valorização de profissionais com filhos no mercado de trabalho. Esta não é uma iniciativa de um dono. Ela é de todo pai e de toda mãe que deseja carregar seu filho no peito com orgulho, sem a necessidade de ocultar esta informação do mercado de trabalho.
MM360 – Como os candidatos podem responder a essa questão de forma objetiva e profissional?
Se a pergunta for feita, sugerimos que o(a) candidato(a) aborde o fato de maneira positiva ao invés de ficar se desculpando: “Sim, tenho filhos e eles me convidaram a ser uma profissional com novas habilidades, tais como…”. E se restar alguma dúvida por parte da empresa, a dica para o recrutador é: pergunte o que você realmente quer saber sem fazer suposições. Quer um exemplo? No lugar de perguntar se a pessoa tem filhos e assumir que este fato impedirá a candidata a viajar a trabalho, por exemplo, simplesmente pergunte: “você tem disponibilidade para viajar a trabalho?”. Só isso basta.
MM360 – De que maneira os filhos impulsionam o desenvolvimento profissional de seus pais/ responsáveis?
Os filhos são um laboratório de inovação e um programa intensivo de desenvolvimento de soft skills para seus pais e responsáveis que acontece na relação pai e filho. Acreditamos que pais e mães presentes e participativos na vida dos filhos são profissionais que desenvolvem novas habilidades sócio-emocionais e que conseguem transpor para suas carreiras novas formas de encarar problemas complexos, de exercerem uma liderança mais empática e de serem mais criativos.
Segundo relatório do Fórum Econômico Mundial, “pensamento crítico”, “criatividade” e “inteligência emocional” são algumas das competências que todo profissional vai precisar ter até 2020 e transbordam em profissionais com filhos. Desenvolver a capacidade de mediar a briga entre filhos é, por exemplo, uma excelente oportunidade para exercitar a gestão de conflitos num ambiente de trabalho. E os impactos positivos de trabalhar com pais e mães também é percebido pelo empregador de acordo com diversos estudos e pesquisas. Inclusive, separamos alguns dados, como:
- Contratar mulheres com filhos pode aumentar a produtividade, a criatividade e ainda melhorar o relacionamento com os clientes, segundo 65% dos executivos que participaram de um estudo da Regus, consultoria especializada em flexibilizar ambientes de trabalho, com 65 mil profissionais pelo mundo.
- Para os homens, a participação na criação dos filhos estimula o desenvolvimento da paciência, da compreensão e da capacidade de adaptação, de acordo com estudo “Family Man: Fatherhood, Housework, and Gender Euqlity (Oxford University)” e mais da metade dos empregadores (57%) afirmam que mulheres com filhos trabalham melhor em equipes do que as que ainda não são mães. Esta é a conclusão de uma pesquisa da Microsoft com 2 mil funcionários e 500 empregadores nos EUA.
MM360 – Qual a importância de termos um ambiente de trabalho mais acolhedor aos profissionais que têm filhos?
Criar um ambiente de acolhimento é fator decisivo para permitir que mulheres alcancem posições de liderança nas organizações já que a maternidade é, sem dúvida, um teto de vidro no desenvolvimento da carreira de muitas profissionais no Brasil e no mundo. Os fatos comprovam este impacto: o número de mulheres em posições de liderança nas 500 maiores empresas do Brasil é de apenas 13,6%. A chegada dos filhos influencia diretamente neste dado já que 48% delas não retornam ao trabalho em até dois anos após o nascimento dos filhos, segundo estudo da FGV. Impulsionar a carreira de profissionais com filhos tem, inclusive, um impacto social crítico. O intervalo desde a gestação até os dois anos de uma criança, mais conhecido como os “primeiros 1.000 dias de vida”, é considerado um período decisivo que pode mudar radicalmente o destino da criança, não apenas em termos biológicos mas também em questões intelectuais e sociais.
MM360 – Como as empresas podem ajudar seus colaboradores a conciliarem a carreira com a criação dos filhos ao invés de incentivar uma escolha a outra?
Como ponto de partida, começamos esta jornada junto aos nossos clientes com uma pergunta simples porém pouco intuitiva: “Você já perguntou para seus funcionários como a sua empresa poderia ajudá-los neste sentido?”. É preciso escutar o colaborador e entender o momento da empresa e, então, criar de forma assertiva os caminhos a seguir. A Filhos no Currículo acredita muito no poder da co-criação de soluções em parceria com os próprios colaboradores.
Normalmente as respostas passam por uma inovação nas políticas e processos da companhia tanto para pais quanto para mães, envolvimento das lideranças, “autorizando” suas equipes a viverem na práticas os valores da companhia, e foco especial com a fase do retorno após o período da licença. Este último ponto, e não menos importante, se refere ao período de até dois anos após o nascimento do filhos, fase em que quase metade das mães saem do mercado de trabalho. Para auxiliar as empresas a receberem de volta essas profissionais, desenvolvemos em parceria com a aceleradora B2mamy o RESET, um programa in company para mulheres com filhos que desejam organizar o retorno ao trabalho e desenvolver seu poder de persuasão, negociação e networking a partir de técnicas de comunicação, assessments de autoconhecimento e sessões de mentoria.
MM360 – De que forma as políticas de acolhimento podem impactar a vida profissional dos colaboradores que têm filhos?
As políticas de acolhimento impactam no engajamento de profissionais com filhos. Quando a empresa autoriza que o tema seja pauta na sua organização, está indiretamente reconhecendo e validando os dilemas que mães e pais enfrentam diariamente ao conciliar carreira e filhos. Programas em prol da primeira infância, por exemplo, impactam diretamente a produtividade de funcionárias. Esta foi a conclusão de um estudo conduzido pela ReadyNation com mais de 1.000 líderes americanos membros desta organização empresarial.
MM360 – Onde as empresas precisam focar quanto à evolução do tema carreira e filhos para que os profissionais se sintam mais seguros?
Acreditamos que a evolução do tema passa por inovar nas relações de trabalho, repensando o ambiente de trabalho para acolher as demandas de profissionais com filhos e, acima de tudo, tratando seu colaborador como um ser humano integral que age melhor quando se sente melhor. Jornadas flexíveis, vagas compartilhadas, retorno gradual, trabalho remoto e licença parental são algumas das tendências neste sentido.
Além disso, quando o assunto é FILHOS & CARREIRA, é preciso mudar o mindset de que esta é uma pauta exclusivamente da mulher e atrair toda a comunidade necessária para a criação de um filho para dialogar e ser ouvida. As empresas que repensarem as suas políticas com mais isonomia e levarem em consideração as novas configurações familiares e a vontade de muitos homens em construir uma relação de vínculo com seus filhos, estarão permitindo que muitos profissionais com filhos, sejam eles homens ou mulheres, sejam protagonistas em suas carreiras.
MM360 – O que falta na cultura corporativa para que ter filhos e ter uma carreira bem sucedida possam ser assuntos vistos/tratados como algo natural?
Faltam exemplos bem sucedidos de líderes que “chegaram lá” sem a necessidade de abrir mão de suas famílias e que vivem na prática os valores da companhia, autorizando seus subordinados a fazerem o mesmo (liderança walk the talk). Falta migrar esta pauta exclusivamente da mulher e atrair toda a comunidade necessária para a criação de um filho para dialogar e ser ouvida, pensando em políticas mais isonômicas como licença parental. Falta uma cultura pautada em resultados, com estruturas de trabalho mais ágeis e horizontais que permitam aos profissionais com filhos trabalharem em jornadas mais flexíveis que se adequem às suas necessidades. Falta a consciência de que o maior diferencial do ser humano é exatamente ser humano e criar espaço dentro das organizações para acolher suas vulnerabilidades. Falta reconhecer filhos como um valor no currículo de pais e mães. E por isso, lançamos o movimento #meufilhonocurriculo criado pela Filhos no Currículo e B2 Mamy pela valorização de profissionais com filhos no mercado de trabalho. Convidamos pais e mães a literalmente colocarem seus filhos no currículo e no perfil do LinkedIn com a #meufilhonocurriculo.