Renato Souza


Aporofobia: uma análise sobre o repúdio às pessoas em situação de pobreza
O fenômeno da aporofobia, caracterizado pela aversão às pessoas em situação de pobreza, representa uma realidade social complexa e lamentável que permeia diversas sociedades. Em muitos casos, o status socioeconômico determina a percepção e o tratamento dispensados às pessoas, resultando em discriminação enraizada em preconceitos, estereótipos e falta de empatia.
Esta aversão se manifesta desde olhares desaprovadores até atitudes discriminatórias no cotidiano, exigindo com que o reconhecimento dessa realidade para que possamos atuar de maneira a questionar e combater esses comportamentos. O termo “aporofobia” foi cunhado por Adela Cortina, filósofa espanhola, combinando “áporos”, do grego para “sem recursos”, e “fobia”, denotando medo ou repulsa.
Cortina utiliza essa expressão para descrever o repúdio, o desprezo ou a discriminação direcionados às pessoas pobres ou economicamente desfavorecidas. A aporofobia não apenas representa um medo, mas também reflete a exclusão social e a falta de consideração em relação às pessoas menos privilegiadas financeiramente, destacando a urgência de reconhecer e combater essa forma de discriminação.
No contexto brasileiro, a pobreza persiste como um desafio estrutural que afeta milhões de pessoas, apesar dos esforços em políticas sociais ao longo dos anos. A desigualdade econômica continua sendo uma questão predominante, resultando em dificuldades no acesso a serviços essenciais, condições precárias de moradia e trabalho para muitos cidadãos. Atualmente, o Brasil se destaca nos índices que avaliam o nível de desigualdade social e econômica entre os países.
Segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano 2021/2022, divulgado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Brasil ocupa a 14ª posição nesse ranking, compartilhando essa colocação com o Congo, ambos registrando um índice de 48,9. Essa posição é corroborada por dados do Índice de Gini, um coeficiente utilizado para mensurar a concentração de renda.
A disparidade entre classes sociais é evidente, com uma parcela significativa da população vivendo abaixo da linha da pobreza, enquanto outros desfrutam de privilégios e oportunidades. O Brasil enfrenta profundos desafios para manter, de forma eficaz e sustentável, a luta pela redução dessa desigualdade, especialmente em regiões com carência de acesso e recursos básicos.
Embora programas sociais tenham sido implementados para mitigar tais disparidades, ainda há muito a ser feito em termos de políticas públicas visando um desenvolvimento mais equitativo e sustentável para todas as pessoas brasileiras, além daquelas que escolhem o nosso país para construírem ou reconstruírem suas vidas.
As estatísticas sobre pobreza e extrema pobreza no Brasil variam ao longo do tempo e são influenciadas por diferentes metodologias de medição. Os dados indicam uma parcela significativa da população vivendo em condições de pobreza. Segundo o IBGE, em 2020, aproximadamente 26,4% da população vivia abaixo da linha de pobreza, significando viver com menos de R$ 436 por mês, conforme a linha oficial de pobreza estabelecida pelo governo naquele período.
Em relação à extrema pobreza, aproximadamente 12,8% dos brasileiros estavam nessa condição em 2020, vivendo com menos de R$ 156 por mês, segundo os critérios estabelecidos pelo governo. Contudo, é importante ressaltar que esses números podem ter sofrido alterações desde então, influenciados por fatores econômicos, políticas públicas e outros eventos que afetam a dinâmica socioeconômica do país.
As interseções entre classe social, gênero e raça são cruciais para compreender a complexidade das desigualdades sociais. No Brasil e em diversos lugares do mundo, esses fatores interagem e se sobrepõem, gerando situações de marginalização e discriminação para grupos específicos.
Conforme apontado pelo Nexo Jornal em 2017, a pobreza no Brasil tem cor e é preta, refletindo a intersecção de desigualdades sociais. O termo “classe social”, originado na sociologia do século XIX, busca estratificar o mundo de forma socioeconômica dentro de um sistema capitalista. Karl Marx dedicou-se à compreensão das classes sociais, examinando sua composição, fatores que as diferenciam e como interagem.
Embora as definições de classes sociais tenham fornecido uma compreensão didática das desigualdades, elas também reforçam a hierarquização social, criando divisões e perpetuando disparidades. A aporofobia, além de ser um fenômeno social, é também material e tangível. Ela se manifesta nos comportamentos, nas interações cotidianas e nas políticas públicas.
Em fevereiro deste ano, o Congresso Nacional apresentou o PL 355/2024, que propõe instituir uma campanha permanente de combate à aporofobia nas escolas públicas e privadas de todos os estados brasileiros. Este projeto de lei destaca a importância de abordar o repúdio às pessoas em situação de pobreza desde a infância, visando promover uma cultura de inclusão e respeito.
Em suma, a aporofobia representa um desafio significativo que deve ser enfrentado com medidas tanto individuais quanto coletivas. A conscientização sobre essa forma de discriminação, aliada a políticas públicas eficazes, é fundamental para promover uma sociedade mais justa, inclusiva e equitativa para todas as pessoas.