Melissa Vogel


Nossas conquistas são muitas! E precisam ser contadas e celebradas
Quantas vezes nós, mulheres, de maneira automática, respondemos que o nosso sucesso e conquistas são simplesmente decorrências naturais de nossos esforços? Confesso que, muitas vezes, eu mesma já fui inclinada a seguir por este caminho.
Relato aqui uma dessas situações. A Kantar IBOPE Media acabava de se associar ao Movimento Mulher 360. Fui então convidada a participar, pela primeira vez, como painelista do “Café com CEOs” do MM360, que tinha como tema central o papel de liderança feminina e seu reflexo no ambiente de negócios.
Era sabido que durante o debate passaríamos pela discussão de como mulheres líderes se sentiam nesse papel, e quais fatos e comportamentos atribuíam a terem chegado em posições de liderança. Lembro de ter me preparado para a conversa com argumentos que revelavam uma jornada construída, sim, com esforço, que levavam a conquistas quase orgânicas, uma combinação de contextos e oportunidades bem aproveitadas.
Meu discurso parecia estar redondo e fazer sentido. Até o momento no qual pessoas bastante próximas, que me acompanharam na preparação e até após assistir o debate, chamaram atenção e me provocaram sobre o quanto a minha correta e adequada fala, de alguma forma, minimizava o tamanho dessa longa jornada das mulheres em busca de nossos espaços!
Neste momento, entendi o porquê de ser provocada. Será que, ao não trazer claramente o tamanho e a intensidade real deste esforço, eu não estava, simplesmente, me desviando da questão central do debate e normalizando uma realidade? De fato, além desse discurso não fazer bem a mim, também não estava alinhado ao que sempre acreditei. Sobre o poder transformador de uma troca genuína, da inspiração no outro e do crescimento coletivo.
Durante alguns dias procurei entender a razão da minha dificuldade de aprofundar e reconhecer a dimensão dos desafios. E como erros, acertos e aprendizados dessa jornada se tornavam ainda mais relevantes em ambientes corporativos e sociais ainda com baixo grau de equidade de gênero. Com menos espaços de poder ocupados por mulheres.
Ao refletir sobre o assunto, comecei a entender que esse meu comportamento poderia ser o resultado de uma combinação de fatores. De um lado, aquela dose de síndrome da impostora, que me puxava a minimizar o valor do meu esforço e do meu mérito. Do outro, uma obrigação imposta por mim, no sentido de mostrar um grau de naturalidade e indiferença, desviando a necessidade de explicar, quase com culpa, estar ocupando alguns lugares.
Desde então, eu faço questão de constantemente refletir de maneira recorrente sobre cada um dos desafios dessa minha jornada e como reagia a cada um deles. Comecei também a fazer o mesmo quando eu ouvia histórias de outras mulheres, passei a refletir sobre todos os comportamentos apresentados, valorizando e celebrando, cada vez mais, os méritos das conquistas.
Racionalizar sobre como respondemos a esses estímulos e provocações, oportunidades, erros e acertos contribuem não apenas para o meu amadurecimento, bem como me permitem compartilhar minha jornada. Definitivamente, acredito muito que ambientes de troca e apoio, como assim é o MM360, nos ajudam a construir coletivamente bons caminhos e soluções.
Considerar que vivemos em múltiplos contextos e compartilhar e ouvir sobre outras jornadas individuais ou coletivas, estratégias e ações são ações fundamentais para reconhecer e reconfirmar que ainda temos grandes desafios relacionados à pauta de equidade de gênero. Além de nos ajudar a priorizar as pautas que precisam ser discutidas, para construção da conscientização coletiva e respectivas ações afirmativas.
Leia a última coluna de Melissa Vogel: Um olhar sobre a economia de cuidado